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As bocas e os braços das pedras!

  • Foto do escritor: Puri Vivo
    Puri Vivo
  • há 12 horas
  • 3 min de leitura
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por Daniel Purí


Um dia durante uma reunião em uma comunidade na Serra dos Purí, a música da mística de abertura da reunião foi uma música católica, esta música é bastante comum entre aqueles que iniciaram o processo de reconstrução da autoestima camponesa e indígena em nosso território, ao qual começou a partir das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs). As CEBs foram um trabalho pastoral que está por trás da gênese de quase todos os movimentos de libertação dos camponeses brasileiros. Esta música tem o seguinte verso: 

“Se calarem a voz dos profetas

As pedras falarão

Se fecharem os poucos caminhos

Mil trilhas nascerão”

Este verso que me trouxe uma profunda reflexão: As forças espirituais que nos criaram e nos mantém de pé, apesar de todas as violências trazidas pela invasão colonial a nosso território, nos sustentam com a intenção de sermos as bocas e os braços das pedras! Ponto que explicarei ao longo deste texto.

            Todos que já viram de longe a nossa Serra sabem a quão magnífica e quase perfeitamente vertical é, suas montanhas se deslizam sobre a superfície terrestre como as vertebras constituintes de uma coluna formando uma barreira natural que atua como uma mãe, abrigando e refugiando ao longo de milênios seus filhos que voam, caminham, brotam, plantam e florescem sob os seus cumes e pés. Os Arrepiados, nome dado ao subgrupo Purí nativo da região e que se reivindicavam como uma comunidade a partir de seu corte de cabelo característico, são os humanos que as Serras escolheram para serem seus filhos e com suas habilidades humanas a defender.

Muitos podem dizer que as montanhas (as pedras), não são dotadas de alma, no entanto muitos de nós a sentem como uma verdadeira força materna que nos deu o próprio corpo que temos e nos nutre. As montanhas de pedra em seu desgaste natural pelo dançar das chuvas e dos ventos ao longo de eras deram origem as terras em que vivemos. As terras em que vivemos abrigam ricas águas, uma infinidade de árvores e animais, é também desta terra onde crescem os nossos alimentos. Ao consumirem do alimento desta terra e tomarmos de suas águas começamos a nos tornar feitos dos mesmos minerais que compõe as terras e as pedras, nos tornando junto com as árvores e outras formas de vida, os filhos destas rochas. Ao longo de séculos com os mais velhos retornando a terra após a morte e uma infinidade de colheitas dos mais ricos alimentos já não dava pra diferenciar esta população da própria terra que os nutre como uma mãe.

A insistência dos Arrepiados em estar em sua terra e a defender vem dessa interação, os próprios são feitos dos mesmos minerais das montanhas, ao resistirem à investida dos bandeirantes no século XVII, fechar por diversas vezes as lavras de ouro no início do século XIX e resistirem nesta terra todos estes séculos ocorre porque já não é possível mais separam este povo da mãe que os acolheu e nutre. A missão deste povo é ser a voz das pedras e todas as formas de vida que crescem no entorno, entre e sobre elas, sendo estas formas de vida nossas irmãs, feitas dos mesmos minerais e água que nós.


Somos as pedras capazes de falar e

os braços capazes de fazer mil trilhas nascerem!

 

 
 
 

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